Menu fechado

Escrevo por querer escrever, e quando escrevo me sinto uma tradutora simultânea do que penso.
Escrevo por querer organizar um pensamento complexo, por ser uma forma de escutar – pausadamente, as coisas que moram dentro de mim, e claro, por querer que você também escute – e exceto por esse último motivo, escrever é um ato de presença pra mim – enquanto eu escrevo, pra que quando você chegar aqui, se torne um ato de presença pra você – enquanto você escutar.

Vim contar que comecei a investigar dentro de mim a ressonância da palavra querer.
Onde moram meus quereres, quando os uso, como se reproduzem, quais suas consequências, do que eles se alimentam, quais os seus (não-)porquês.

E claro, não é só o uso dessa palavra em específico que merece ser investigado. Mas vamos uma coisa de cada vez.

Muitas vezes, sou leviana ao verbalizar minhas intenções, mas comecei a perceber que toda vez que eu falo que quero alguma coisa, e não desembolo na prática, isso mina o meu poder de realização, e me atrapalha a acreditar em mim, já que se eu falo uma coisa e faço outra estou faltando com a verdade comigo, e, aos poucos, essa ação banalizada tem um impacto negativo direto no meu autorrelacionamento, e na forma como eu me vejo. 

Estranho o surgimento da palavra “autorrelacionamento”. O que o Google tem a dizer?
“Na Álgebra relacional um autorrelacionamento acontece quando os elementos de uma entidade se relacionam com eles mesmos.”

E seres humanos? Também não possuem autorrelacionamentos? Há ciência que é o estudo de fenômenos externos, e há siência com “S” de si mesmo?

*Pausa pra sonhar com um mundo em que olharemos pra dentro com a mesma atenção e curiosidade que olhamos pra fora*

Não é porque pensamos o tempo inteiro que estamos prestando atenção em nós mesmos.
Não é porque falamos com outros que estamos ouvindo o que temos a dizer a nós mesmos.

Autorrelacionamento é saber-se necessário de atenção, um telefonema mental “alô, como vai você?”, um gesto de carinho, um interesse genuíno numa memória banal. Um café passado na hora, uma palavra de conforto nos momentos difíceis. Longas e profundas conversas. Silêncio contemplativo.

Dialogar-se através de diferentes linguagens para conhecer-se.

Construir um autorrelacionamento à base de confiança assim, como em qualquer relacionamento, só é possível com uma comunicação baseada na verdade, onde se sente o que se fala, e isso se manifesta porque a palavra tem valor pra além do entendimento.
Pensar nisso mudou a forma como enxergo autoconfiança. A autoconfiança é obviamente autoconstruída. Não é um botão, demanda tempo. Não é involuntária só porque eu sou eu. Não é indestrutível, e é preciso cuidado. A autoconfiança se renova a todo o tempo, uma verdade por vez.

E daí entendi que no autorrelacionamento, se não respeito o poder das palavras, estou faltando com respeito a mim mesma, porque a linguagem, em todas suas expressões verbais e não-verbais, é a forma que eu tenho de mostrar que eu me importo comigo.

E querer?

Querer é um verbo, transitivo, direto. Uma sequência de palavras que decorei, sem nunca refletir sobre o significado. 
Verbo se associa a verbal. Verbalizar tem a ver com dizer, dizer tem a ver com se expressar com palavras (normalmente) com alguma intenção; 
Transitivo, tudo aquilo que transita, e que pode mudar de lugar, ou ter um destino exato… 
Direto tem a ver com honestidade, objetividade, precisão.

Em resumo: querer é dizer que quero me mover para chegar a algum lugar.

Querer é poder, diz o ditado. Dissecando: que tipo de poder? Nem tudo que eu quero eu posso ter, mas posso fazer um movimento de tentar ter algo que eu quero – e acho que esse último poder é o único poder que importa, porque é o único que está sob o nosso controle.

Se quero, verdadeiramente, logo algo precisa ser feito. Querer é movimento.

Essa ideia dialoga com o terceiro post do instagram da miolo:

Nessa postagem meu b.o. era com a banalização da palavra acreditar, porque afinal que crença é essa que te mantém deitado esperando as coisas acontecerem?

E agora: que querer é esse que te mantém parado?

Toda vez que você fala que quer algo sem estar disposto a passar pelo processo que esse algo exige, das duas uma: ou você é um 🍌 e seu querer não tem poder realizador algum, ou você não quer de verdade.

A boa notícia é que existe solução pras duas coisas, e a solução começa quando você consegue identificar qual dos dois é o seu caso.

Felizmente a resposta que você procura está aí dentro, e quem sabe, com sorte, posso te ajudar com algumas perguntas.

Caso 🍌: 
Por que estou agindo assim?
Existem fatores físicos me atrapalhando? 
Como estou cuidando da minha saúde mental?
O que posso fazer pra melhorar?

Caso sem querer:
Por que não quero fazer isso?
Realmente tenho que fazer isso? Se sim, qual a melhor forma de fazer? Como posso me motivar a querer?
Vale a pena? 
Se não, por que estou insistindo nisso?

Eu passei a levar muito a sério: o uso da palavra querer.
 
Tem que tomar cuidado, não dá pra sair falando que quer as coisas “sem querer” e sair ileso.
 
É tão bobo e tão sério ao mesmo tempo!
 
E se torna mais fácil abrir mão apenas por não querer também – o que já é motivo suficiente.
 
E a partir de abrir mão, sobra espaço pra descobrir outras coisas que se quer realmente, e por querer realmente, não ficar enrolando pra fazer o que tiver que ser feito – mesmo se for difícil.
 
E sobre ser difícil: qualquer escolha tem suas dificuldades. Foi quando comecei a perceber que tudo gira em torno de justificativas: quando há razões pra não fazer, as justificativas são desculpas & quando são razões pra fazer, se tornam argumentos, e no fim das contas entendi que sempre vão ter desculpas e argumentos pra justificar o lado que você quiser!
 
Então, no final o que importa é o querer. E isso poupa tempo!

O querer é uma inteligência que quando a gente menospreza, acaba gastando muita energia tentando justificar tudo o que se faz, ou não se faz.

Ai, que alívio acreditar no querer! De repente não preciso mais procurar motivo pra tudo, nem questionar o tempo todo.
 

Às vezes, nada é mais libertador do que um belo “fiz porque quis”, ou também um belo “não fiz porque não quis”. 

Procurar motivo gasta tempo demais, e tira o foco do que realmente importa:
o que você quer de verdade?